Sabeis avaliar o aspecto da terra e do céu. Como é que não sabeis avaliar o tempo presente?
(Lc 12,56)
A evangelização ou catequese sempre foi uma característica da Igreja, que nasceu do anúncio da Palavra e para este fim sempre viveu. Os evangelistas deixam clara essa missão dos apóstolos (Mt 28,28; Mc 16,16), e o livro dos Atos dos Apóstolos (1,8) confirma essa necessidade de expandir a boa-nova para além das fronteiras de Jerusalém e até os confins do mundo. Em torno desse eixo orientador, o Livro dos Atos dos Apóstolos se desenrola, tendo a Palavra de Deus – viva e atuante na pessoa do Ressuscitado – como protagonista dos eventos que mostram como a Igreja nascente vai crescendo e se organizando.
Com o passar do tempo, a compreensão dessa missão de evangelizar tomou nuances diferentes. A Igreja – no dinamismo que lhe é próprio – encontrou caminhos alternativos para anunciar a boa-nova de Jesus. Em cada momento, a visão que a Igreja tinha de si mesma se tornou o principal fator de mudanças neste quadro evangelizador. Assim, a mensagem cristã passou por evoluções, tomou novas formas até chegar ao que se tem hoje.
Atualmente, percebe-se na prática pastoral a carência de um discurso coerente. O pressuposto da cristandade – o qual ainda perdura – falsifica o discurso catequético, pois o mundo hodierno não respira mais o ar sacralizante – ou sacralizado! – da Idade Média. A Igreja se defronta com uma realidade complexa: católicos tradicionais que querem manter os costumes e a doutrina; batizados, com princípios religiosos, mas sem nenhuma vivência cristã, seja no campo ético ou no campo litúrgico; pessoas de boa vontade, mas impregnadas de ideologias religiosas muito mais que do conhecimento de sua fé; católicos de ocasião – batismo dos filhos, crisma, casamento, missa de sétimo dia e outros eventos; uma elite mínima e minimamente bem formada teologicamente, etc. Um grupo diversificado quanto à prática do evangelho e até mesmo quanto à profissão de fé. Várias Igrejas Católicas convivem dentro da Grande Igreja, unificadas por algumas prescrições litúrgicas, pelo mesmo papa e pela boa vontade de acertar. Uma multidão excessivamente plural, pessoas impregnadas do espírito da pós-modernidade, bastante secularizadas, embora com evidentes sinais do retorno do sagrado, vai achando o caminho de volta para a casa da mãe-igreja.
Nesta conjuntura eclesial, uma tensão se instalou dentro da Igreja. Há perguntas que não querem se calar: Como conviver com essa pluralidade eclesial? Como se abrir para novos tempos, sem perder as raízes e a estabilidade da fé conquistada em dois mil anos de seguimento de Cristo? Como unificar a Igreja, sem massificar seu público? Ou, pelo menos, como falar uma linguagem minimamente compreensível para todos, capaz de motivar e estimular os católicos a perseverarem no seguimento de Jesus? Como evangelizar hoje? Como fazer catequese nesta realidade tão pouco homogênea? Como viver a unidade em meio ao diferente? Que colorido dar à formação do fiel católico? Como fazer pastoral?
Certamente nossa reflexão não vai responder a questões tão complexas, nem encontrar soluções para tais problemas. Nem de longe há essa pretensão! O desejo é mais singelo. É tão somente pensar caminhos, avaliando o caráter dinâmico da evangelização, e, ao mesmo tempo, realçar a urgente necessidade de um discurso mais apropriado para esse quadro de conflitos, onde o velho e o novo se atropelam, sem encontrar um equilíbrio.
Para melhor pensar essas questões, faz-se mister um levantamento da história da catequese da Igreja. Afinal, um modelo de catequese ou evangelização não se instala de um dia para o outro. Não basta um documento da Igreja ou uma “reflexão teológica da moda” para transformar uma realidade tão complexa como essa. A instalação de um modelo catequético é lenta, gradual – quase silenciosa! – mas, certamente, tem marcos visíveis que sinalizam sua chegada e firmam suas bases.
É importante localizar dois eventos fundamentais na história eclesial, que muito impulsionaram a compreensão que a Igreja tem de si mesma e deram rumos distintos à evangelização: o Concílio de Trento e o Concílio Vaticano II. Mas isso fica para nosso próximo encontro.
1.Muitos gostam de estabelecer uma diferença entre catequese e evangelização. Dizem que evangelização é um processo mais querigmático. Seria o primeiro anúncio da fé para pessoas que não fizeram ainda a experiência de Deus. E a catequese seria mais doutrinária e significaria o aprofundamento do primeiro anúncio. A Igreja precisaria primeiro evangelizar para depois catequizar. Mas hoje já se diz que a própria catequese deve ser querigmática, apresentando seus conteúdos de modo a aprofundar não um conhecimento, mas uma experiência de Deus. Então, tudo se mistura. Por isso, a palavra “formação” tem sido retomada na Igreja para falar do que diz respeito ao discurso, à linguagem evangelizadora. A Igreja, muitas vezes, tem preferido usar a palavra formação para designar o que se acostumou chamar de catequese ou evangelização. Em nossa reflexão, esses termos serão usados em seu sentido amplo, sendo tomados como sinônimos.
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SOLANGE MARIA DO CARMO
DOUTORANDA EM CATEQUESE E PROFESSORA DE TEOLOGIA BÍBLICA NA PUC-BH
AUTORA DA COLEÇÃO CATEQUESE PERMANENTE DA PAULUS EDITORA COM P. ORIONE (MATERIAL QUE SERÁ ADOTADO PELA DIOCESE DE LORENA EM 2010).
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