Primeira leitura: Isaías 53, 10-11
Oferecendo sua vida em expiação, ele terá descendência duradoura.
Salmo responsorial: 32, 4-5.18-20.22
Sobre nós venha, Senhor, a vossa graça, pois, em vós, nós esperamos.
Segunda leitura: Hebreus 4, 14-16
Aproximemo-nos, com confiança, do trono da graça.
Evangelho: Marcos 10, 35-45 ou 10, 42-45
O Filho do Homem veio para dar a sua vida como resgate para muitos.
O evangelho de hoje nos apresenta um detalhe da realidade que Jesus tem de enfrentar em seu ministério público. Marcos com grande habilidade vai mostrando ao longo do relato evangélico as diferentes compreensões e reações que os ouvintes de Jesus vão manifestando, e nessas mostras de Marcos também estão incluídas as dos próprios discípulos. A intenção de Marcos é fazer ver que não se compreende a mensagem de Jesus assim de pronto, e que pegar o caminho de Jesus requer, além da graça de Deus, um processo que exige o rompimento com qualquer outro caminho andado, um total e completo desaprender o aprendido para não confundi-lo com a novidade que representa o caminho proposto por Jesus. É mais ou menos o que João quer dizer com o diálogo de Jesus com Nicodemos: “é preciso fazer-se como uma criança para poder ver o reino de Deus” (João 3,3). É que a proposta de Jesus não pode confundir-se com ideologia alguma.
Precisamente porque existe uma inclinação a pôr o projeto de Jesus na mesma gaveta das tendências e ideologias do momento, deu-se o que se deu com os discípulos de Jesus. Não foi somente o que nos conta a passagem de hoje; veja-se a reação de Pedro (e deve-se entender a de todo o grupo) quando Jesus anuncia pela primeira vez sua Paixão (Marcos 8, 31-33); a incapacidade dos discípulos de expulsar um espírito imundo de um moço (Mc 9, 14-29); quando de novo Jesus anuncia sua Paixão, os discípulos não entendem nada e ficam com medo de lhe fazer perguntas (Mc 9, 30-32); sua discussão sobre quem é o maior, sinal claro de sua confusão a respeito da “novidade” de seu Mestre e de suas implicações (Mc 9, 33-37); a tentação de excluir alguém que, sem ser do grupo, estava expulsando demônios em nome de Jesus (Mc 9, 38-39); a reação pouco amistosa dos discípulos contra os que traziam algumas crianças para que Jesus as abençoasse (Mc 10, 13-14); a dúvida sobre a possibilidade de subsistência se se renuncia a tudo, e a reivindicação de recompensa para eles que tinham deixado tudo (Mc 10, 26.28); as pretensões de ocupar os melhores lugares no reino de Jesus (Mc 10, 37); por fim, a traição de um deles (Mc 14,10) e, por parte de todos, o abandono na hora da prova definitiva. Recordemos que na Paixão e na crucificação somente algumas mulheres observavam de longe o que se passava com Jesus. Em resumo, Marcos traça um caminho, pelo qual não é fácil andar, sobretudo pelas implicações que já observamos: retroceder, desaprender, esvaziar a consciência...
Pois bem, reflitamos sobre o que aconteceu com Tiago e João: Marcos já havia anunciado (em 10, 32) que eles estavam a caminho de Jerusalém e Jesus ia adiante deles. Por via das dúvidas, Jesus recorda que não se trata de uma viagem de recreio à capital: pela terceira vez, anuncia o que lhe acontecerá em Jerusalém. Jesus vai à frente. Nunca um mestre ia atrás de seus discípulos . Contudo, Marcos sublinha este detalhe não para dar a entender alguma posição privilegiada de Jesus. (Prova disso é o que é dito no versículo 45, a auto-definição de Jesus). Ele vai à frente porque está convencido do que está fazendo. Considera que é o momento (a hora, diz João) de aparecer em Jerusalém, de chegar até onde tem que chegar seu ministério de serviço. Expõe-se quem vai adiante. Os discípulos se assombravam, iam atrás dele, mas tinham medo (v. 32). Somente depois do “final feliz”, anunciado por Jesus (sua ressurreição ou glorificação), aparecem Tiago e João para fazer a “reserva” dos postos mais importantes do reino que ele inaugurará. No relato de Marcos, os dois irmãos falam diretamente com o Mestre; em Mateus, o pedido inusitado é deixado para ser formulado pela mulher de Zebedeu! Qualquer crítica recairia sobre ela, teria sido idéia dela, a mãe (ah!, as mães…). Qualquer coisa, tirariam o corpo fora e… tudo ficaria em paz!
O que nos mostra a pretensão dos dois irmãos? Primeiro, que não conseguiram entender absolutamente nada do que Jesus quer inaugurar, passam por cima de tudo o que haviam visto e ouvido ao longo do tempo de formação com o Mestre. Em segundo lugar, as expectativas deles sobre o Reino de Deus, o reinado que Jesus pretende instaurar, têm já um modelo preconcebido em suas consciências, a ponto de não permitir nenhuma modificação, não obstante tudo aquilo em que Jesus tanto insistira. Terceiro, para eles o modelo do reinado de Deus seria uma versão aperfeiçoada dos reinos temporais. Quarto, no reinado de Deus, instaurado por Jesus, será mantido — achavam eles — o mesmo esquema de dominação da relação socioeconômica vigente: senhores-escravos, ricos e empobrecidos, dominadores e dominados. Quinto, não há compromisso nem ao menos intenção de envolvimento pessoal na instauração desse reino, isso era com o chefe, ele é quem deveria “arriscar a pele” e eles aproveitariam; quem iria beber o “cálice” era ele…
A resposta de Jesus é simples: esse detalhe não lhe compete, isso é decisão do Pai, além disso, recorda-lhes que antes da glorificação é necessário beber o cálice, o “lançar-se nas águas” não admite recuo.
Mais uma vez, Jesus tem de corrigir a visão triunfalista, nacionalista e militarista do messianismo. A nova era inaugurada por Jesus tem de prescindir de qualquer rastro de domínio. Ingenuamente, os discípulos pensavam que uma mudança de dominador traria vantagens e benefícios pessoais e coletivos. Jesus corrige essa forma de pensar; por melhor que seja quem domina, a estrutura como tal continua sendo prejudicial. O Messias pode ser o próprio Filho de Deus e até ser muito bom, muito santo, mas se seu reinado seguir o mesmo esquema de dominadores–dominados, senhores e escravos, aí não haverá santidade que valha. Eis aí, portanto, a novidade do reino, instaurado por Jesus, seu reinado se exerce a partir do serviço e do entregar-se em prol dos dominados e dos escravizados pelos poderes temporais e se quisermos nos aproximar da instauração do reinado de Jesus não nos resta outra alternativa: renunciar a todas as estruturas e instâncias onde exercemos domínio, e nos colocarmos a serviço do marginalizado, do excluído. É a única coisa que pode garantir um pouco de credibilidade num mundo, dividido entre dominadores e dominados, entre senhores e servos…
FONTE: PORTAL CLARET
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