sexta-feira, 6 de maio de 2011

O referencial da formação permanente (parte 2)



Quando falamos de formação na fé, logo nos perguntamos: “Nossa catequese quer formar o cristão para que?” Já vimos que formar para os sacramentos e para a vida comunitária não é suficiente. Então, pensemos em outras possibilidades.

Formar para a militância
Uma questão difícil de ser questionada é essa: “Nossa catequese quer formar o cristão maduro ou o militante? O militante será necessariamente um cristão maduro? Um cristão maduro será necessariamente um militante?”.
Estamos mexendo em campo delicado. Criou-se na Igreja um preconceito contra esses questionamentos, de modo que hoje parece “politicamente incorreto” até tocar nesse assunto. Uma pessoa que questionar a diferença entre o cristão maduro e o militante será tida como alienada. Mas vamos aproveitar que os próprios catequetas brasileiros estão enfrentando essa questão, para mexer mais nesse assunto.
A preocupação com a realidade sócio-política fez nascer uma catequese que parte dos problemas sociais e políticos. O problema da terra, da saúde, da pobreza, do esgoto no bairro virou conteúdo da catequese. Isso, sem dúvida, foi um avanço, porque trouxe para o processo formativo uma análise da realidade muito válida e necessária, porque é profundamente humana.
Mas poderíamos hoje nos perguntar se o processo formativo sistemático e permanente que a evangelização exige é só para resolver problemas e, mais ainda, se dentro de toda a complexidade da realidade atual, só vamos enxergar os problemas sociais.
Parece necessário questionar certas expressões, que até viraram chavões na catequese. Que seria mesmo a tão falada “catequese fé e vida”? Que significa de fato uma “catequese pé no chão”? Quais as dimensões de uma “catequese libertadora”?
Um cristão maduro certamente é aquele que, entre muitas outras coisas, assume o compromisso com a sua realidade. Mas se a pessoa se preocupa apenas com os problemas sociais e políticos, talvez não tenha ainda descoberto toda a beleza da fé cristã. É um grande homem, sem dúvida; mas não necessariamente um seguidor de Jesus.

Formar para a vida
A expressão “formar para a vida” parece rica e tentadora. Mas corre-se o risco de cair em um humanismo reducionista – o que seria perigoso. A emergência da subjetividade fez a reflexão catequética descobrir os vários aspectos da vida humana e se preocupar com todos eles. Já é um grande avanço, porque se tem uma compreensão mais ampla da vida, não mais restrita apenas às necessidades mais elementares. A vida humana foi entendida em sua complexidade. Mas não podemos correr o risco de fazer de nossa formação, ou de nossa catequese, apenas um esforço para dar respostas mais profundas às questões da vida humana, fazendo um discurso humanista, colocando a pessoa no centro das discussões, como se tudo se resolvesse com a solução da problemática antropológica. Sabemos que a fé cristã é profundamente antropológica, mas vai além disso. Jesus se preocupou com a pessoa e colocou a vida humana no centro das discussões, mas foi além disso: despertou a pessoa para o transcendental, desafiou as pessoas a crer. E a fé leva, certamente, a um horizonte maior e mais amplo que a simples preocupação com aspectos emergentes da vida humana. A fé é um encontro dessa pessoa com Deus. E isso faz muita diferença. Humanismo sem Deus não seria verdadeira catequese. Nem conseguiríamos responder a todos os anseios humanos sem direcionar a pessoa para o encontro com Deus.
Então, a catequese deve sim iluminar a vida das pessoas. Mas não podemos nos limitar a dar respostas humanistas para os problemas das pessoas, correndo o risco de perder o horizonte da fé.
Há outro discurso catequético que fala em formar para a vida, mas entendendo a vida como vida comunitária, vida engajada, para que a pessoa assuma a vida da comunidade. Nesse caso, a preocupação ainda é com o engajamento nas chamadas lutas da comunidade, ou seja, estaríamos formando ainda o militante, o membro da Igreja, com a preocupação de atrair fiéis para a Igreja que se vê, muitas vezes, perdendo seguidores. Seria uma preocupação em fortalecer a Igreja, num mundo em crise. Nada contra a ideia de fortalecer a Igreja. Somente pensamos que a catequese não deve se limitar a isso nem adotar esse referencial como seu objetivo maior. Uma formação permanente cumpre também esse objetivo, sem se limitar à tarefa de oferecer respostas para as necessidades humanas.
Outro aspecto que se deve ter em conta é que muitas pessoas ainda não assumiram uma compreensão mais ampla da vida. Em muitos ambientes eclesiais, a subjetividade continua sendo olhada com desconfiança. E a individualidade é vista como individualismo. A Igreja ainda tem certo receio de que a emergência da subjetividade comprometa a pregação engajada do Reino de Deus. Pois o cristianismo, dizem, prega a renúncia de si mesmo para seguir Jesus. Precisamos deixar claro que a valorização da pessoa, de sua individualidade, de sua subjetividade não coloca em risco o compromisso comunitário e social do Reino de Deus. Uma coisa não contradiz a outra. Pelo contrário, pessoas mais realizadas são capazes de um compromisso mais efetivo com Jesus e seu Reino. A dimensão antropológica precisa ser valorizada, mas a fé cristã é mais que simples antropologia.

Formar para o seguimento de Cristo
O grande objetivo da Igreja é formar discípulos, seguidores de Cristo. A Igreja entende sua missão assim. Os apóstolos foram chamados por Jesus para serem pescadores de homens. Ao assumir sua missão, eles transmitiam a fé e formavam novos seguidores de Cristo. A Igreja nasceu com essa tarefa. A evangelização era compreendida como processo pelo qual novas pessoas tinham a oportunidade de conhecer e seguir Jesus. Aqui está o ponto fundamental da nossa fé: conhecer Jesus e fazer a opção de segui-lo, tornando-se discípulo. Podemos então falar de formação ou catequese como discipulado, englobando todos os aspectos anteriores. Com efeito, o discípulo de Cristo abraça o evangelho como força que traz realização pessoal e que, ao mesmo tempo, motiva a pessoa a participar da vida comunitária da Igreja. O seguidor de Cristo milita nas causas sociais, celebra os sacramentos e valoriza a vida em plenitude. E faz tudo isso porque está iluminado pela força da fé, que o impulsiona em toda a sua vida.
Esta missão da catequese está expressa de forma muito clara naquilo que disse o Papa Bento XVI, e que o Documento de Aparecida fez questão de citar: “Não se começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande idéia, mas através do encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá um novo horizonte à vida e, com isso, uma orientação decisiva” (DA, 243).
Por isso, o referencial de nossa formação permanente vai ser sempre proporcionar o encontro com Cristo, sempre mais aprofundado e assumido por quem deseja ser discípulo de Jesus. Esse encontro se dá pela mediação da Igreja, a qual, por meio da catequese, oferece aos fiéis oportunidade de conhecer Jesus e fazer sua opção por ele.
Em Igreja, como Igreja e com a Igreja, os fiéis são chamados a fazer a experiência de fé, que desperta neles o desejo do discipulado. Vivendo como seguidores de Cristo, os fiéis encontram sua realização pessoal, pois o evangelho é fonte de alegria e de vida plena; fazem seu compromisso ético, assumindo os valores propostos por Jesus; e participam da comunidade eclesial, pois ela é a família escatológica dos seguidores de Cristo.

Textos da professora Solange Maria do Carmo em parceria com o Pe Orione Silva e que serão publicados em formato de um livro, pela editora Paulus, com o título Catequese permanente: fundamentos e organização.

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