sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Como fazer uma catequese bíblica?



Outra necessidade que hoje se sente é fazer uma catequese bíblica. Esta preocupação está clara em todos os documentos da Igreja. Ela surge da constatação de que a catequese antiga, anterior à renovação catequética, ainda se baseava nos catecismos tridentinos, de perguntas e respostas para serem decoradas, que se preocupavam essencialmente com a doutrinação, sem ajudar o católico a mergulhar na experiência de fé relatada na Bíblia Sagrada. Os movimentos bíblicos mais recentes perceberam que os católicos não conhecem a Bíblia. E daí surgiu o apelo para que a catequese fosse “mais bíblica”. Chega-se a dizer que a Bíblia é o principal livro da catequese. Concordamos plenamente que a Bíblia Sagrada é o principal livro não somente da catequese, mas de toda a vida da Igreja, pois contém os relatos de fé que norteiam nossa vida e nos ajudam a fazer a nossa experiência de Deus. Mas a afirmação de que a Bíblia deve ser o livro principal da catequese levou a entendimentos diversos e nem sempre profundos.
Vejamos! Alguns pensaram que se deveriam ser abolidos quaisquer outros subsídios na catequese. Bastava levar a Bíblia e “estudar” com os catequizandos textos bíblicos – os mais diversos. Colocamos estudar entre aspas para frisar que a catequese em muitos casos passou a ser um estudo bíblico, geralmente feito sem um método adequado.
Alguns catequistas passaram a fazer da catequese círculos bíblicos, momentos em que se liam textos bíblicos, escolhidos a esmo, e se tiravam mensagens edificantes para a vida.
Outros passaram a estudar a Bíblia, ensinando como foi formada, em que língua foi escrita, quantos livros possui, em quantas partes se divide: uma espécie de introdução à Sagrada Escritura.
Outros preferiram entronizar a Bíblia Sagrada, colocando-a sobre um altar enfeitado, para dizer que a catequese era bíblica porque a Bíblia estava sempre ali, iluminando o encontro. Mas quem disse que a Bíblia sobre o altar ilumina o encontro?
Outros passaram a incentivar cada catequizando a ter a Bíblia, levá-la para o encontro, para ler nela os textos usados na catequese. Ou davam tarefas de ler textos bíblicos em casa. E a tarefa sempre caía nas costas dos pais, que nem sabiam como pegar numa bíblia.
Todas essas iniciativas mostram o desejo de se seguir o que a Igreja propõe. São boas iniciativas, mas cremos que não alcançam por si só o objetivo do que se chama catequese bíblica.
O uso das Sagradas Escrituras na catequese é importante, mas requer um cuidado especial. A própria Igreja reconhece isso e alerta para o risco de leituras reducionistas (cf. Diretório Nacional da Catequese, n. 113), ou de leituras ingênuas (cf. Crescer na Leitura da Bíblia, Estudo 86 da CNBB, n. 17). Outros documentos chegam a admitir que a Bíblia é um livro mais voltado para adultos e é preciso ter especial cuidado ao usá-la com crianças.
Isso nos leva a pensar que não basta pegar a Bíblia, abrir e ler, sem maiores cuidados, para se fazer uma catequese bíblica.
Primeiro, devemos ter em mente que a nossa catequese será bíblica se tomar a Bíblia Sagrada como uma narrativa da fé de um povo que nos ajuda a fazer a nossa experiência de Deus. Não nos basta compreender como os povos antigos fizeram sua experiência de Deus, como narrado na Bíblia. Precisamos fazer a nossa experiência, narrar a nossa fé, a partir da Bíblia Sagrada. Precisamos descobrir como as experiências narradas na Bíblia se tornam Palavra de Deus para nós hoje.
Para isso, não basta apenas ler um texto bíblico ou outro. Precisamos de uma metodologia para lidar com a Bíblia. Senão, corre-se o risco de ler sempre os textos mais fáceis e conhecidos; ou ler o texto que o Espírito Santo inspirar, naquele momento, abrindo a Bíblia como quem tira sorte – o que não é recomendado de modo algum; ou ler textos de difícil compreensão que, se mal entendidos, podem confundir mais que clarear a experiência de fé.
Em nossa coleção Catequese Permanente, apresentamos para cada encontro um texto bíblico. Para crianças dos cinco até por volta dos nove anos, propomos que os textos nem sejam lidos na Bíblia. Apresentamos até mesmo uma “tradução” do texto em linguagem simplificada, para que a criança ouça e acolha a Palavra. Nos encontros da pré-evangelização (5-7 anos), transformamos o texto bíblico em uma história a ser contada para as crianças. Nos Módulos 1 e 2 da Evangelização fundamental, para crianças de os 8 a 11 anos, traduzimos o texto numa linguagem mais apropriada para a criança e, a partir do módulo 3, quando imaginamos que a criança tenha cerca de dez anos ou mais, sugerimos ler o texto diretamente na Bíblia. Mas sempre colocamos uma explicação do texto que ajuda o catequista a entender a mensagem de fé que o texto quer transmitir. E, nas dicas para o catequista, fornecemos pontos de exegese e de hermenêutica para que o catequista aprofunde sua compreensão do texto.
Dessa forma, organizamos os textos bíblicos a partir dos conteúdos da fé que queremos levar a turma a fazer sua experiência de fé. Nós partimos do que entendemos como experiências básicas ou fundamentais da fé, para fazer uma catequese de iniciação. Se não fosse assim, cairíamos em um simples estudo da Bíblia por si só, sem levar em conta as particularidades das Sagradas Escrituras.
Como sabemos que nem todo catequista tem formação mais profunda sobre a Bíblia Sagrada, e como os nossos livros se dirigem ao catequista, apresentamos o necessário aprofundamento teológico, para que o catequista entenda bem os textos propostos e possam ajudar os catequizandos a entendê-los também. Estamos convencidos de que uma catequese bíblica não exclui os subsídios, ao contrário, exige subsídios que ajudem o catequista a lidar com as particularidades exegéticas e hermenêuticas das Sagradas Escrituras.
Talvez seja bom lembrar que nossa Igreja católica tem um cuidado muito grande com a leitura da Bíblia e faz essa leitura de modo muito diferente de outras Igrejas mesmo cristãs. Parece haver certo modismo de ler a Bíblia, sem levar em conta a qualidade dessa leitura. Mas pensamos que a leitura mal feita da Bíblia Sagrada pode prejudicar a compreensão e a vivência dos mistérios da fé.

Textos da professora Solange Maria do Carmo em parceria com o Pe Orione Silva e que serão publicados em formato de um livro, pela editora Paulus, com o título Catequese permanente: fundamentos e organização.

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