Profª Solange Maria do Carmo
Se há algo no mundo da religião que parece não sair de
moda é o ato litúrgico, a celebração. Todas as religiões têm seus cultos.
Pessoas de fé, independente do credo professado, reúnem-se em oração para
celebrar, dar glória, oferecer sacrifícios, pedir perdão, cantar louvores. O
culto à divindade parece fazer parte da vida humana; poderíamos até dizer que
ele é uma necessidade antropológica. Mesmo na religião católica, hoje tão
ameaçada na sua hegemonia por causa do crescimento das Igrejas Evangélicas e de
outras correntes religiosas, percebemos ainda a força da celebração litúrgica.
Pessoas já desligadas da prática católica ainda conservam o velho costume de
frequentar a missa, nem que seja de vez em quando! Mesmo os chamados católicos não-praticantes vão a algumas
celebrações especiais: o casamento de um amigo, as exéquias ou a missa de
sétimo dia de um parente, o batizado de um afilhado... A velha e surrada missa
continua ajuntado multidões, apesar do notável esvaziamento das igrejas. A
adoração ao santíssimo ou as novenas e procissões continuam mobilizando grupos
enormes. E as peregrinações? E os eventos em torno de nomes religiosos
importantes como os santos? Nós teríamos um sem-fim de exemplos para lembrar
como nossa gente gosta de se ajuntar para celebrar. A prática cotidiana não nos
desmente!
E na
catequese? Será que a celebração também tem sua importância, tem seu papel?
Muita gente acha que catequese é aula de catecismo. Uma espécie de ensino
religioso para crianças, com finalidade de prepará-las para receber a primeira
comunhão ou a crisma. Nada mais equivocado! A catequese, como já dissemos
anteriormente, não é aula. Nem seu fim é a recepção de um sacramento. A
catequese é lugar de encontro com Deus e não de aprender religião. Certamente
que, ao fazer nosso encontro com Deus, vamos conhecendo-o pouco a pouco, vamos
entendendo melhor nossa religião, vamos mergulhando no mistério que professamos
e nos tornamos capazes de dar as razões da nossa fé. Mas o objetivo da catequese
não é ensinar religião. É dar às pessoas a oportunidade de conhecer Jesus e se
apaixonar por ele, tornando-se de fato seu seguidor.
Um bom exemplo
desse conhecimento de Deus encontra-se no livro de Jó. O livro de Jó é uma
novela, uma espécie de conto, escrito para combater uma teologia estranha
daquela época, a teologia da retribuição – infelizmente não ausente de nossas
igrejas! – que dizia que Deus premia os bons e castiga os maus. O autor, muito
inteligente, criou uma novela cujo personagem principal é um homem muito justo
e santo que só recebe castigos e sofrimentos como recompensa de sua vida reta.
Jó ficou azedo com Deus, afinal haviam lhe ensinado que o sofrimento era castigo
de Deus, e Jó quis uma satisfação. Os amigos de Jó tentaram explicar, mas
explicações teológicas não foram suficientes. Um tal Eliú tentou intervir com
enormes discursos, mas também não deu resultados. Até que Deus se manifestou a
Jó. Foi no encontro com Deus que o coração de Jó se aquietou. Ele disse mais ou
menos assim: “Ah, agora sim, Senhor, eu te vi face a face, porque antes eu te
conhecia só de ouvir falar de ti”. Depois do encontro com Deus, Jó ficou em paz. Os sofrimentos da
vida continuaram, mas Jó entendeu que a vida é sofrida mesmo e que, se estamos
com Deus, todo sofrimento pode ser superado ou suportado, pois Deus é nossa
força. Ele entendeu que Deus não castiga ninguém, nem fica premiando os
bonzinhos. Deus simplesmente está conosco nos animando na caminhada, pois as
pelejas da vida são muitas.
Tomando o
exemplo de Jó, podemos dizer que a catequese quer ajudar cada criança, jovem ou
adulto a fazer seu encontro pessoal com Deus. Encontrar Deus, fazer sua
experiência cristã de Deus, não é o mesmo que estudar os fundamentos da fé. O
estudo não promove necessariamente o conhecimento de Deus, apesar de
facilitá-lo. Toda teologia dos amigos de Jó e de Eliú não fizeram com que Jó se
sentisse mais perto de Deus. É bem verdade que uma boa teologia tem seu lugar
de destaque e não pode ser desprezada, assim como uma teologia distorcida só
trará prejuízos para o conhecimento de Deus. Mas a experiência de Deus, o
encontro pessoal com ele, não vem de raciocínios teológicos, mas da abertura
sincera de coração para Deus, que se manifesta em nossa vida nas pequenas
coisas. Promover esse encontro não é coisa fácil. Por isso a importância da
celebração na catequese.
O que é
celebrar? Celebrar é fazer culto, ou seja, cultuar ou cultivar. O que é que a
gente cultiva? A celebração é aquele encontro no qual a gente cultiva nossa
amizade com Deus. Se a gente vai a um culto e não cultiva essa amizade mas
apenas cumpre rubricas (regras litúrgicas), então a celebração não cumpriu seu
fim. Quando vamos a um ato litúrgico, devemos sair de lá mais perto de Deus do que
quando chegamos, precisamos ter reforçado nossos laços de amizade e comunhão
com ele, precisamos ter aprendido a confiar mais nele e a nos comprometer com o
que ele nos ensina. O culto não é uma obrigação dominical como muitos entendem
que é a missa. O culto não é para acalmar a cólera de Deus. O culto não uma
obrigação chata que devemos cumprir por intransigência divina. Não! O culto é
lugar do encontro com Deus, que se manifesta na ação litúrgica da comunidade
reunida. Por isso, catequese e liturgia andam de mãos dadas. Não podem ser
separadas de jeito nenhum. A catequese deve ser litúrgica, ou seja, celebrar por
meio de gestos e símbolos o mistério pascal e promover o encontro com Deus. E a
liturgia deve ser catequética, ou seja, ajudar a aprofundar por meio da escuta
da Palavra de Deus o mistério pascal que a assembléia reunida celebra. Catequese
e liturgia: uma coisa complementa a outra. Daí a importância das celebrações na
catequese: momentos profundos, orantes, verdadeiras liturgias que ajudam a
turma a fazer seu encontro com Deus. Devem, pois, os catequistas capricharem na
preparação destes momentos celebrativos.
Mais artigos da profa. Solange no:
www.fiquefirme.com.br.
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