Profª Solange Maria do Carmo
A segunda fase escolar da catequese
aconteceu em contexto diferente. O mundo cristão e religioso da sociedade
tradicional deu lugar a um mundo moderno e cheio de questionamentos que a razão
insistia em colocar em pauta. O século XIX despontou no horizonte cheio de
novidades e a inteligência humana ganhou destaque, prometendo um mundo
maravilhoso por meio da técnica e da ciência que cresciam cada vez mais, trazendo
sempre novos progressos. Tudo que a inteligência não explicasse, que ela não
pudesse destrinchar, justificar, fazer crível, deveria estar sob suspeita.
Então, as respostas do catecismo que pareciam cair prontas do céu já não faziam
mais sentido. O que a gente não entendia, a gente rejeitava. E apesar de o
catecismo de Trento perdurar (como foi a catequese que recebi nos anos 70),
outro modo de fazer catequese já se implantava com força. A catequese passou a
ser aula de religião, mas não como antes para decorar perguntas e respostas,
mas para buscar as razões da fé.
Para buscar as
razões da fé, era preciso partir da capacidade reflexiva do ser humano e não de
um pacote de verdades que cai pronto do céu. Mas isso parecia um absurdo: o
Concílio Vaticano II (1962-1965) logo deu jeito de ajudar a gente nesta tarefa.
Com seus documentos nos fez ver a beleza da encarnação: mostrou como Deus
entrou na história humana e agora faz parte dela. Seu Filho é um homem
igualzinho a nós, com as mesmas necessidades e sujeito às mesmas condições
históricas. Deus se dá a conhecer no ser humano Jesus. Então, tudo que é humano
tornou-se belo e cheio de significado. A vida humana: a razão, as necessidades
humanas, os sofrimentos, as alegrias, tudo tem o dedo de Deus que se revela em
Jesus de Nazaré. Olhando para Jesus, a gente entende quem é Deus; a gente vê
Deus nele. Então, a fé é mais razoável e mais concreta e palpável do que a
gente pensava e decorava no antigo catecismo. Era hora de esclarecer essa
fé.
Para
esclarecer a fé, foi preciso traduzi-la em categorais paropriadas para seu
público. O primeiro passo foi abandonar o antigo catecismo e fazer “um
catecismo” mais com a cara da gente. Foi aí que se multiplicaram os manuais
catequéticos por toda parte, no desejo de fazer uma catequese pé no chão, bem
pertinho da realidade do povo, na linguagem da criança, do jovem, do adulto, de
acordo com a vida cotidiana da gente. Nada de respostas prontas. Nada de
perguntas pré-fabricadas. Aquele Deus, dito como “espírito perfeitíssimo
criador do céu e da terra”, não fazia parte do universo imperfeito e nada
espiritual do povo. O inferno cheio de demônios horrendos não ameaçava mais que
os horrores da própria vida, as doenças, os sofrimentos, a pobreza, a fome, a
guerra. Os “degredados filhos de Eva” não entendiam mais a vida como vale de
lágrimas ao qual estavam destinados, mas como desafio e promessa de dias
melhores. A fé transmitida foi questionada; os dogmas foram postos em suspeita.
Entendeu-se que a fé não cai pronta do céu, que ela brota do chão da vida, da
realidade concreta, da vida humana. Compreendeu-se que a fé ilumina a vida, mas
a vida real é que dá sentido à fé. Fé e vida; uma dupla que não pode ser
separada. Neste contexto ganhou terreno outro tipo de catequese, chamada no
Brasil com o nome de catequese renovada.
Nesta inovação
o antigo catecismo ficou para trás. A catequese renovada deu seus frutos, fazendo
a passagem do catecismo (que era
previamente fabricado) para a catequese (construída
com a turma a partir de sua realidade).
Mas, infelizmente, essa catequese ainda não deu conta de fazer a passagem da
aula para o encontro. Mesmo com todo esforço, a catequese continuou escolar:
caderno de catequese, livro de catequese, catequista como professor de catequese,
catequizando como aluno de catequese. Uma aula mais dinâmica, é verdade, com
temas mais apropriados, com teologia mais popular, com métodos mais modernos,
com pedagogia menos imposta e mais construída com a turma, mas ainda assim uma aula ou um curso. E isso pode ser
visto ainda hoje nas paróquias: a catequese funciona como um curso de religião
por ocasião dos sacramentos. Um curso com direito a festa de formatura e tudo
mais no final. Por isso é tão difícil a perseverança. Se o curso acaba com a
recepção do sacramento, acaba a motivação para frequentar. E os catequizandos
vão embora. Nada de anormal: estão no seu direito. Com este formato de
catequese, todinha em torno dos sacramentos, não há mesmo motivação para
continuar. Sobre isso, vamos falar no próximo número. Vamos ver algumas paróquias
estão implantando uma catequese que não gira em torno da preparação para os
sacramentos, apesar de contemplar a recepção deles; esta catequese propõe uma
caminhada de discipulado, de conhecimento de Jesus, uma oportunidade de crescer
na amizade com ele. E os pais, os catequizandos e toda a comunidade paroquial
só tem a ganhar com isso.
Mais artigos da profa. Solange no:
www.fiquefirme.com.br.
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